Os deuses não nos protegem do medo. Eles nos convidam à coragem de viver a despeito dele.

Amada, esse texto é para ler com tranquilidade (Rubem Alves é sempre certeiro e têm palavras bastante fortes), buscando uma reflexão sobre o tema. É momento de mostrar toda a força que existe em você e de transformar medo em CORAGEM. Nós sabemos que você é capaz e temos a certeza de que você também conhece toda a sua força, não é ?! (Edson Bastos)

   Tenho Medo ... (Rubem Alves)

Um casal de amigos enviou-me um fax com um pedido: que lhes mandasse os nomes dos livros que tenho sobre o medo. Explicaram a razão do pedido: tinham medo... E pensavam que pela leitura daquilo que sobre o medo se escreveu como ciência e filosofia, o seu próprio medo ficaria mais leve.

Procurei fazer o que me pediam. Pus a funcionar os arquivos da minha memória, procurando identificar os livros sobre o medo que estariam na minha biblioteca. Inutilmente. Nenhum título me veio à mente. Dei-me conta de que não possuo nenhum livro sobre o medo. Sem livros a que recorrer, pus-me a pensar meus próprios pensamentos sobre o medo. E o primeiro pensamento que me veio foi o seguinte: Eu tenho medo. Eu sempre tive medo. Viver é lutar diariamente com o medo. Talvez esse seja o sentido a lenda de São Jorge, lutando com o dragão. O dragão não morre nunca. E a batalha se repete, a cada dia.(...)

E foi com esse texto que acordei no dia seguinte, deixado por meu amigo Edson Bastos sobre a mesa do café, acompanhado por um outro livro dele, esse da foto acima – O mundo num grão de areia – O ser humano e seu universo. Após um banho demorado, no qual minhas lágrimas escorriam pela face se misturando a água do chuveiro, pude perceber que eu tinha chances de lutar, e a minha primeira de muitas começaria naquela manhã, em minha primeira consulta no HAM (Hospital Aristides Maltez), com a Dra. Silvana Vianna.  
Sala de espera, cara de assustada, e uma multidão de gente que iam e vinham todo tempo, passando pelos corredores, descendo e subindo e todos com olhares de ‘medo, preocupação e esperança’. (eu era apenas mais uma naquela multidão.) Alí misturavam-se gente de diferentes classes sociais, religiões, raças, sexos... mas todas com um único objetivo, que era lutar contra essa doença tão temida.
Chegou minha vez, e entrando na sala da médica com os resultados de todos os exames feitos anteriormente ela me fez a seguinte pergunta, com ar de espanto: ‘você tem certeza que esse resultado é seu menina’? – Afirmei com a cabeça!
E então, ela disse: ‘ são coisas desse tipo que vão sempre intrigar-nos, os médicos...’
E após fazer-me algumas perguntas e pelas minhas respostas chegar a conclusão que eu não ‘tinha perfil’ para ter um câncer de pulmão, perguntou-me se ela podia examinar-me. Após esse procedimento, ela disse: meu Deus, olhando pra você, eu diria que você não tem nada, escutando você com o estetoscópio não ouço se quer um chiado no peito... E em resumo, falou: ‘Izabel, seu caso será tratado com quimioterapia, eu não poderei te acompanhar no tratamento porque minha especialização é cirurgia torácica. Você terá que fazer uma avaliação com um médico oncologista clínico, e ele sim, te encaminhará às sessões de quimioterapia.”
Mas, quando fomos marcar essa consulta, só teria vaga no sistema para 19 de outubro. Ela inconformada disse: nossa, você tem toda chance do mundo, você é nova e eu vou ter que fazer alguma coisa. Usarei de toda influência que tenho aqui dentro com meus colegas, para conseguir essa consulta pra você pra ontem. Pediu-me o meu número de contato e deu-me o dela. Dia seguinte, pela manhã, ela enviou-me uma sms que dizia assim: Izabel, você tem consulta hoje a tarde, às 14hs, com Dr. Cleber Gomes. Boa Sorte!

Nossa, ao ler isso meus olhos brilharam! Já pensou, o problema tá em sua porta no mês de maio e você só poder começar a resolvê-lo em outubro ?! A espera sim, me faria muito mal...
E lá fomos nós, dia 23 de maio para o HAM mais uma vez, dessa vez para consulta com o médico oncologista, Dr. Cleber Gomes. E mais uma vez, o tempo não passava naquela sala de espera, pra onde quer que eu olhasse, sempre me deparava com alguém com um olhar meio perdido, assustado. E ficava me perguntando: será que aqui nessa sala, também tem alguém que como eu, está aqui pela primeira vez?! De repente, meus olhos estavam cheios de lágrimas, e um nó preso na garganta não me deixava falar. Olhei pra Adriana e ela disse: calma, vai dá tudo certo, já está dando!

E quando finalmente entrei e sentei-me diante do médico, ele com um olhar sereno disse-me: ah, então quer dizer que você a protegida da Dra. Silvana? Bem que ela me disse que você é muito jovem e simpática. (acredito que essa foi a sua primeira tentativa de quebrar o gelo, me deixar calma.)
Conversamos muito e umas das primeiras frases dele foi: ‘Izabel, quero que saiba que 50% da sua recuperação está em sua cabeça, e por favor, não vá deixar-se impressionar com os casos que você ver aqui dentro e histórias ouvidas em salas de espera, por favor. Cada caso, é um caso. Explicou-me também, entre outras coisas, que 97% de
Câncer de pulmão são em fumantes. E que eu estava nos 03%, quando ocorre é em mulheres, e jovens.
Explicou-me como seria feito o ciclo de quimioterapia, quais seriam os efeitos colaterais da mesma, quais eram o alimentos que me fariam bem, quais iriam fazer-me enjoar mais, que meu cabelo iria cair, mas não completamente, e sim um pouco além do normal.

Pronto, saí dali confiante que dias melhores estavam por mim, que eu estava no caminho certo. Sabia que teria dias complicados, mas que eu iria vivê-los um de cada vez, e que sofrer de véspera não me ajudaria em nada.

Izabel Cristina